A formação dos hábitos de independência pessoal durante a quarentena. – Silvia Eugenia Molina

Estamos vivendo uma situação excepcional nas nossas vidas, que, tudo indica, ainda irá se prolongar. Nesse contexto, os pais têm de enfrentar o desafio de ter que dar conta da vida ativa dos seus filhos (pequenos e/ou crianças maiores), durante todos os momentos do dia, além de resolver o trabalho on-line e as tarefas domésticas. Este escrito busca, precisamente, oferecer ideias sobre como conviver desfrutando do trabalho doméstico, incluindo as pequenas crianças e as crianças mais velhas.
E incluí-las de que maneira? Convidando-as para acompanhá-los, nas diversas tarefas cotidianas, brincando. Pois, é importante levar em conta que as aprendizagens, e mais ainda nos momentos estruturantes do psiquismo na infância, acontecem através de um processo de identificação, sendo este mais eficaz quando prazeroso. Assim, enquanto brincam, as crianças vão se apropriando de aprendizagens que contribuirão com a continuidade da organização subjetiva. Além de ir adquirindo valiosas instrumentalizações, que lhe permitirão ir armando consistência psíquica para dar conta das futuras aprendizagens, tanto das informais (as cotidianas) quanto das formais (aquelas as quais terão de responder nas instituições escolares). Como consequência, tais aquisições incidirão sobre a gradativa constituição do desenvolvimento.
Esta experiência também beneficiará os pais no sentido de compreenderem algo muito difícil de ser levado em conta e de colocarem em prática: oferecer aos filhos a possibilidade de que eles façam por si mesmo tudo aquilo para o qual começam a estar capacitados para realizarem por si mesmos. Entendendo que eles terão que dar conta, tanto no futuro imediato quanto mediato, dos diversos desafios inusitados que a vida constantemente nos apresenta. Circunstâncias frente às quais somente terão possibilidade de orientar-se, quando os pais os introduzam nesta perspectiva do prazer em encontrar as soluções possíveis que as provocações da vida demandam. Ou seja, estas condições psíquicas poderão ser adquiridas quando os pais cuidarem de posicionar os filhos ativamente perante o relacionamento com eles, com os outros e com a vida.
Porém, também, os pais precisam levar em conta que estas transmissões indispensáveis raramente acontecem somente num clima de amabilidade, visto que os filhos precisam desafiar o que lhes é indicado. Assim, podem entender do que se trata a indicação dos pais e encontrar sua forma de apropriar-se do transmitido. Metabolizando, deste modo, têm a possibilidade de metabolizar o que lhes é indicado, a fim de encontrar a maneira (pessoal) de assimilar e executar todas estas aprendizagens organizadoras.
Silvia Eugenia Molina – Psicóloga-Psicanalista. Especialista em Psicologia Clínica UFRGS; Fundador e membro da equipe clínica do Centro Lydia Coriat de PoA; Docente do Centro de Estudos Paulo Cesar D’Avila Brandão do Centro Lydia Coriat de PoA. Coordenador do Grupo de Estudos O Infantil e o Desenho, no seu XXIII ano de existência.